15 novembro, 2012

Internacionalização é aposta para fintar cortes

Representantes das universidades privadas (João Redondo), do ensino público universitário (António Cunha) e politécnico (Sobrinho Teixeira), dos estudantes (Rui Novais da Silva) e dos professores (António Vicente) procuraram uma saída para a crise no ensino superior: a solução passa por procura de receitas próprias e criação de centros de excelência internacional.

O ensino superior está em perigo. As universidades e politécnicos públicos sofrem com os cortes orçamentais, vendo a sua "qualidade posta em causa". E as instituições privadas tem perdido "dimensão e alunos nos últimos anos". A solução para fintar a crise será aumentar as receitas próprias, apostando na internacionalização e conquista de cada vez mais alunos estrangeiros. Diagnóstico e proposta de tratamento da "doença" saíram do debate sobre o ensino superior em Portugal, promovido ontem pelo DN.
Pelo auditório do jornal, em Lisboa, passaram as vozes das universidades privadas (João Redondo), do ensino público universitário (António Cunha) e politécnico (João Sobrinho Teixeira), dos estudantes do privado (Rui Novais da Silva) e do sindicato dos professores (António Vicente). Alberto Amaral (presidente da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior) não pôde comparecer, devido a um impedimento de última hora. Mas, sob a moderação de João Céu e Silva, grande repórter DN, os restantes cinco traçaram o quadro atual do ensino superior no País: a crise é a preocupação, a procura de receitas a motivação.
O momento é grave. Universidades e politécnicos públicos enfrentam cortes médios de quase 10% nas verbas a distribuir no Orçamento do Estado para 2013. E as privadas têm "perdido dimensão e alunos nos últimos alunos" - como a Grande Investigação do DN já revelara e João Redondo, presidente da Associação Portuguesa do Ensino Superior (APESP), confirmou no debate.
Assim, "é inevitável: a qualidade do ensino está posta em causa", resumiu António Vicente, presidente do SINESup (Sindicato Nacional do Ensino Superior). "O problema não é de afetar a qualidade, é de se tornar inexequível o cumprimento do orçamento. Os compromissos assumidos já são superiores àquilo que serão as receitas das próprias instituições", acrescentou João Sobrinho Teixeira, presidente do Conselho Coordenador de Institutos Superiores Politécnicos. E Rui Novais da Silva, líder da Federação Nacional doEnsino Superior Privado e Cooperativo, lembrou como "a crise pode destruir o próprio futuro do País", ao afastar dos bancos da escola pessoas que "poderiam ser mais-valias".
É claro que nem todos contestam os cortes orçamentais previstos para o ensino superior público. João Redondo criticou, sim, o "sobreinvestimento" que os antecedeu: "Não sei se devemos falar de cortes hoje ou excesso de financiamento há uns anos." Mas isso não impede que, à falta do investimento estatal, as universidades públicas tenham de encontrar outras fontes de receita. "As universidades têm capacidade para conseguir formas de financiamento alternativas e têm-no feito. Em média, já têm taxas de autofinanciamento superiores a 50%", revelou António Cunha, reitor da Universidade do Minho e vogal do Conselho de Reitores das Universidades Portugueses.

"Criar centros de excelência internacional"
O desafio é conquistar receitas próprias. E é aí que entra o caminho da internacionalização. "O mercado não é Portugal, é a Europa. Queremos que os estrangeiros venham para cá. Temos capacidade científica e intelectual, recursos humanos e clima para criarmos centros de excelência internacional", apontou João Redondo, recordando como há universidades estrangeiras que usam o saber português para criar cursos universitários de nível mundial (por exemplo, na arquitetura).
António Cunha reforçou a teoria: as universidades portuguesas têm de se afirmar "pela qualidade de ensino, pela investigação que fazem". E Sobrinho Teixeira recordou os esforços dos responsáveis dos politécnicos: "Tentamos com o Governo arranjar formas de financiamento externo, alterando o estatuto do estudante estrangeiro, para permitir o ensino à distância aos países da Lusofonia, e o sistema de ingresso do público adulto, para qualificar a população ativa."
De resto, pela aposta nos "centros de excelência internacional" pode passar também a solução para impedir a fuga de mais "cérebros" para o estrangeiro. "Se não a evitarmos, o País ficará incomparavelmente mais pobre", alertou António Vicente, lembrando que "as pessoas não saem por causa das propostas financeiras, mas por causa dos projetos aliciantes que lhes apresentam".
João Redondo disse não ver nessa fuga uma desvantagem, mas sim uma campanha de promoção do que é nacional: "Lá fora, os portugueses mostram o bem que se faz por cá. A falta de oportunidades cá preocupa-me, mas não acho mal que vão desenvolver projetos pela Europa." Mas António Cunha preferia que os investigadores e docentes universitários continuassem por cá... a cativar estrangeiros para trabalhar ou aprender com eles. "Estamos na luta no espaço europeu e temos capacidade: ainda no mês passado, investigadores portugueses ganharam importantes bolsas do European Research Council."

Reorganização da rede
De resto, outra resposta para a crise pode ser a badalada reformulação da rede e oferta do ensino superior. Mas, quanto a isso, todos concordam: reformar sim, cortar não. "O pior que pode acontecer é fazerem-se reformas criadas por alguém sentado num gabinete a desenhar círculos e outras formas geométricas", alertou António Cunha. E Sobrinho Teixeira frisou que "não há ensino superior a mais, nem instituições a mais". "Quando muito pode haver cursos a mais", assentiu. Assim, "qualquer reformulação terá de ser ponderada", até porque "o País ainda tem um baixo nível de formação e qualificação", advertiu António Vicente.
Rui Novais da Silva ainda sugeriu uma maior aposta na oferta formativa no interior - "onde o público não vai, o privado pode chegar". Mas Sobrinho Teixeira recordou como "a rede atual permite que um jovem de Bragança tenha as mesmas oportunidades do que um de Braga ou de Lisboa". A fechar, o também presidente do Politécnico de Bragança deixou um pensamento positivo: "A diferença para há 25 anos é abissal. Portugal é um exemplo de como se pode trabalhar com pouco e fazê-lo com qualidade."

Publicado em 'DN'.

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